sábado, 27 de abril de 2013

De volta à pobreza


Iludidos por montanhas de dinheiro, ganhadores da loteria gastam tudo para satisfazer desejos




O sonho de ser milionário é o que garante os negócios do paulistano Munir W. Niss, desde a década de 1970. Aos 78 anos, ele coleciona participações em dezenas de reportagens e prefere ser chamado de “Munir, o Pé Quente”. Munir promete ajudar os jogadores a aumentar as chances na loteria, mas confessa que não é fácil ganhar. “É jogar dinheiro fora. No jogo simples, a chance é mínima”, destaca. O veterano está certo. A possibilidade de acertar os seis números da Mega-sena com um jogo de R$ 2 é de apenas uma em mais de 50 milhões.


Mesmo com a probabilidade pequena, muitos brasileiros insistem em fazer apostas sempre que um prêmio acumula. Os jogadores se iludem com a falsa ideia de que a fortuna é a saída para todo tipo de problema. Acabar com as dívidas e ainda ter dinheiro para gastar sem se preocupar com a conta parece um plano perfeito, não é mesmo? Mas ficar rico em pouco tempo também pode gerar problemas. “O dinheiro traz alegria e tristeza, se a pessoa não tiver equilíbrio emocional, perde tudo. Conheço gente que fez loucuras, pessoas que acreditavam que eram donas do mundo, só porque tinham uma fortuna”, opina Munir.


O descontrole emocional e a falta de estrutura pessoal e familiar contribuem para a gastança, segundo o psicoterapeuta Irineu Miano Júnior.


Que o diga o baiano Antônio Domingos, um dos brasileiros que foi enganado por cifras astronômicas. Quando ganhou na loteria, em 1983, ele tinha 19 anos de idade e acreditou que poderia fazer tudo o que quisesse com o prêmio equivalente a R$ 30 milhões. A primeira providência foi se mudar para o hotel mais luxuoso de Salvador à época, onde morou por quase 2 anos na suíte mais cara. Em entrevista concedida ao “Domingo Espetacular”, da Record, Antônio disse que gostava de gastar dinheiro com mulheres, restaurantes sofisticados, carros luxuosos, rodadas de uísque com os amigos, presentes e diárias de hotel que nem chegava a usar. No aniversário de 22 anos, Antônio fez questão de pagar a conta de todos que estavam no restaurante em que ele jantava. Só ali, ele desembolsou R$ 20 mil. “Quando um dos carros quebrava, eu não consertava. Largava aquele e comprava outro. Usava roupas e nem mandava lavar, era tudo descartável”, disse Antônio. A vida de luxo e excessos corroeram a bolada em apenas 5 anos. Antônio afirmou ao “Domingo Espetacular” que se arrependia por não ter ajudado a mãe no período em que era milionário.


Antonio, como muitos, acreditou que com o dinheiro poderia fazer tudo o que quisesse. Ele se esqueceu de algo que o dinheiro não preenche: o vazio existencial. De acordo com Miano, nesses casos, “há um problema emocional, uma grande insatisfação com a vida que leva a pessoa a buscar prazeres imediatos”. Só quando ela perde tudo é que se dá conta que isso não ocorre. E a lição serviu para o baiano: “Hoje eu sou mais feliz porque vivo a realidade. Naquela época eu vivia na fantasia”, declarou Antonio.


A atitude adotada por Antônio Domingos é muito comum entre pessoas que recebem uma fortuna repentinamente, segundo o diretor da Capital Serviços Educacionais, Guilherme Braga. “Para aumentar seu patrimônio, pessoas gastam além do necessário com ‘brinquedos sofisticados’ como carros, iates, joias e casas luxuosas. Com uma abrupta mudança no orçamento, é preciso ficar atento às tentações que esse ‘novo mundo’ irá trazer”, diz.


A ambição de realizar sonhos extravagantes também levou Nivaldo Eduardo dos Santos da riqueza para a pobreza em 6 anos. Em julho de 1972, ele ganhou cerca de R$ 6 milhões na loteria esportiva. Com o dinheiro, ele revestiu os dentes de ouro, pagou pela companhia de várias mulheres e comprou carros luxuosos. Nivaldo gostava de bancar para os amigos viagens de avião de Salvador para o Rio de Janeiro sempre que o time dele, o Bahia, jogava no estádio do Maracanã. Chegou a ser vizinho de jogadores do Flamengo em apartamentos do requintado bairro de Ipanema, no Rio de Janeiro, mas a brincadeira de satisfazer todos os prazeres momentâneos o arrastou de volta para a vida de dificuldades financeiras. “Esse descontrole é como a compulsão por alimentos ou a dependência de drogas”, explica Irineu Miano. De nada adianta tentar preencher o vazio com coisas materiais. Ele vai continuar! O sucesso financeiro só virá com a pessoa totalmente estruturada interiormente. E, aí sim, usar o dinheiro “com sabedoria”, como ensina o educador financeiro Mauro Calil. “Muitos amigos irão aparecer nesse momento, mas saiba lidar com a situação aprazivelmente. O principal erro é o gasto tolo. Realizar compras de objetos caros repentinamente, emprestar dinheiro para terceiros”, destaca (veja mais dicas nas ilustrações espalhadas pela página).


A riqueza acabou levando discórdia para a vida do casal britânico Roger e Lara Griffiths. A dupla ganhou uma quantia equivalente a R$ 5,6 milhões na loteria britânica, em 2005. As ostentações do par incluíram mansões, roupas e acessórios de grife e carros das marcas Porsche, Lexus e Audi. Em uma viagem a Dubai, o gasto chegou a R$ 45 mil entre hospedagem em hotel cinco estrelas e passagens na primeira classe. Em Roma, os Griffiths escolheram suíte com um mordomo só para o casal.




Em março último, Roger e Lara voltaram a ser notícia, mas desta vez para trocar acusações. Em entrevistas ao jornal Daily Mail, eles culparam um ao outro por ter gasto irresponsavelmente toda a quantia do sorteio, o que teria provocado o fim do casamento, após 14 anos de união. “Às vezes eu grito: onde tudo deu errado?”, declarou Roger.


Para o lavrador Renê Sena, que ganhou R$ 52 milhões em julho de 2005, a sorte terminou em tragédia: ele foi assassinado em 2007. Adriana Ferreira Almeida, então companheira de Renê, foi acusada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro de ter encomendado a morte do milionário, mas acabou sendo absolvida em dezembro de 2011. Com juros, a herança está avaliada em cerca de R$ 100 milhões e segue bloqueada por determinação judicial. O patrimônio ainda alimenta uma briga entre Adriana e Renata Sena, filha única de Renê, que disputam na Justiça o direito a todos os bens deixados pelo morto. O último testamento de Renê prevê que cada uma delas receba 50% do montante. Já os irmãos de Renê querem que o documento seja cancelado e que Adriana seja excluída da divisão.


A mais jovem ganhadora da loteria do Reino Unido também se deu mal ao receber mais de R$ 3 milhões quando tinha apenas 16 anos. Callie Rogers acreditava que o dinheiro iria deixar sua vida mais fácil, mas ela acabou viciando-se em drogas e tentou suicídio três vezes. Callie usou boa parte dos recursos para comprar quatro casas para a família, carros novos, roupas de grife e festas. Ela ainda alongou os cabelos e colocou implantes de silicone nos seios, além de ter torrado mais de R$ 680 mil em cocaína. Depois de chegar ao fundo do poço e perder a guarda dos dois filhos que teve com Nicky Lawson, ela conseguiu se recuperar. Em reportagem do jornal Daily Mirror de abril do ano passado, Callie alertou que o dinheiro não traz felicidade. Grávida de gêmeos, ela declarou ainda que havia encontrado o homem de seus sonhos, Paul Penny, e que os filhos eram o melhor presente que poderia ter recebido. “Fiz escolhas ruins com homens. Eu era jovem e estúpida, estava festejando até o ponto onde eu estava totalmente fora de controle. Olhando para trás, estou horrorizada com as escolhas que fiz”, resumiu.




Famosos que já pediram falência


Astro de Hollywood, o ator Nicolas Cage chegou a dever US$ 14 milhões para a receita federal dos EUA. Ele também já acumulou gastos excessivos com 15 imóveis, uma ilha nas Bahamas, dois castelos medievais, 22 carros de luxo, quatro iates e um esqueleto de dinossauro.


Quando morreu, o rei do pop Michael Jackson deixou dívidas estimadas em US$ 500 milhões. O astro conseguiu acumular cerca de US$ 710 milhões durante a carreira, mas começou a perder dinheiro nos anos 1990. O motivo? Despesas que somavam US$ 13 milhões por ano, além de projetos profissionais extravagantes, acordos judiciais por divórcio e acusação de pedofilia e quebras de contrato.


Mike Tyson foi à falência em 2003, após gastanças abusivas, problemas com drogas, sonegação de impostos e uma prisão por estupro. A dívida chegou a US$ 52 milhões. O atleta foi o mais jovem campeão de pesos-pesados, mas perdeu boa parte do dinheiro dos ringues com limusines, festas, roupas, joias, mansões e até tigres brancos.


Whitney Houston vendeu 200 milhões de álbuns durante a carreira e foi premiada seis vezes com o Grammy, mas perdeu boa parte da fortuna com escândalos relacionados a álcool e drogas. Ela chegou a receber adiantamento da gravadora Arista para a produção de um novo disco, mas morreu antes de concretizar o projeto, em fevereiro de 2012.


Herói do Botafogo e das Copas de 1958 e 1962, o brasileiro Mané Garrincha perdeu todo o dinheiro ganho na carreira com o alcoolismo.

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