“Este ano parece que vou passar o Natal sozinha. Me separei, não tenho ninguém e meu único filho mora longe de mim. Estou me sentindo muito triste. É horrível essa sensação.” A mensagem foi publicada por Maria Ilza de Almeida, de 50 anos, em um site de desabafos uma semana antes das comemorações de final de ano. Em vez das conversas, dos abraços e dos brindes que aconteciam em muitas casas, Ilza passou a data sozinha, sem ceia especial e assistindo à televisão. “Abri e fechei a janela quando vi os fogos. Parece que você não quer viver o que não pode participar, foi aí que chorei”, relembra.
Ilza não está só. Assim como ela, muitos conhecem a solidão, que pode aumentar no final do ano. “É uma época feliz, mas que também remete à tristeza para alguns que não estão próximos de pessoas que gostariam de estar”, explica o psicólogo e escritor Alexandre Bez.
Sem o filho por perto, que há 6 anos vive nos Estados Unidos, Ilza diz que seu principal problema hoje é a solidão. “Às vezes acontece alguma coisa boa e sinto muita vontade de contar para alguém ou acontece algo de ruim e quero desabafar, mas nunca tenho ninguém. Não tem como fugir da depressão”, diz. Ela perdeu os pais e pouco vê sua irmã, que vive longe. O término de seu segundo relacionamento foi traumático e Ilza pensou até em se matar. Há alguns meses fazendo terapia, ela acredita que esta é apenas uma fase a ser superada. “Voltei a trabalhar, a acreditar na vida. Hoje estou melhor e penso que é uma questão de tempo para voltar a ver o meu filho e também para encontrar alguém. Eu não quero morrer sozinha”, afirma.
Quem atende aos chamados no Centro de Valorização da Vida, entidade que oferece gratuitamente atendimento a quem precisa de apoio emocional imediato, sabe a importância de se ter alguém para conversar quando bate a solidão. “Falta alguém com quem se comunicar e que consiga compreender as atitudes e decisões que esta pessoa tomou, sem críticas ou julgamentos”, explica Adriana Rizzo, voluntária há 13 anos.
Desde que veio da Bahia para trabalhar em São Paulo, a operadora de caixa Romilde Silva Santos, de 21 anos, mora sozinha e conta que nem sempre é fácil lidar com os momentos de solidão. “Às vezes, me sinto sozinha e choro. É difícil. Não gosto de trazer ninguém aqui”, lamenta.
O estudo britânico “A Sociedade da Solidão?”, realizado por cientistas da Mental Health Foundation em 2010, mostrou que quase a metade (48%) dos 2.256 entrevistados concorda que as pessoas estão ficando, em geral, mais solitárias. Segundo dados da pesquisa, um em cada dez britânicos disse sentir solidão frequentemente. Entre os mais atingidos estão os idosos e pessoas de meia-idade – período da vida em que os divórcios, a saída dos filhos de casa, a aposentadoria e o luto se acumulam –, além dos desempregados e doentes. Mas se engana quem pensa que os jovens estão livres da solidão: 36% das pessoas entre 18 e 34 anos se preocupam por estar só.
Lídia dos Santos Alexandre, de 19 anos, sabe bem a dor de não estar perto da família. Quando adolescente, ela se envolveu com drogas, o que fez com que seus pais a colocassem para fora de casa. Há 9 meses, ela se mudou de Ferraz de Vasconcelos, na Grande São Paulo, para a capital. “No começo eu sofri muito e fiquei doente. Não conhecia ninguém aqui. Foi uma mudança radical. Fácil não é, mas agora lido melhor com a situação.” Hoje, ela conta com o apoio de uma amiga e do grupo Força Jovem da IURD.
Uma pesquisa do Observatório da Solidão, de Portugal, mostrou que são os divorciados quem mais se sentem sós, seguidos pelos casados e, por fim, pelos solteiros. Depois do fim de dois relacionamentos, José Sopranzi Filho, de 59 anos, quer ter uma nova família para partilhar seu dia a dia em São Paulo. Longe das filhas e dos netos, ele mora sozinho desde 2006. “Durante a semana, enquanto trabalho, não sinto a solidão. Mas quando chega o final de semana, é triste. Acabo ficando em casa e, às vezes, saio com os meus amigos, mas não gosto de noitadas”, conta.
Acompanhadas ou sozinhas, as pessoas podem se sentir solitárias em qualquer lugar. “Você pode estar numa festa e se sentir só. A solidão é um sentimento interno”, afirma Bez. Ainda, segundo ele, o pior tipo de solidão é aquela sentida a dois, quando o casal está junto não por afinidade e amor, mas sim para aplacar o terrível medo de ficar só.
Vida moderna
De acordo com a pesquisa britânica, o estilo de vida moderno contribui para que as pessoas se sintam sós. “Trabalhar por longos períodos, viver sozinho, perder o emprego ou não ter dinheiro suficiente para sair e encontrar os amigos são situações onde as pessoas podem se sentir isoladas”, explica Simon Smith, chefe de política da Mental Health Foundation.
Na era da internet, muitos recorrem à tecnologia para driblar o sentimento da solidão. “O telefone e a internet me ajudam a preencher a vida”, assume Ilza. Assim como ela, aproximadamente dois terços dos britânicos disseram que a tecnologia ajuda as pessoas a manter contato com outras. Ainda assim, um em cada cinco admitiu gastar muito tempo conversando virtualmente com amigos e familiares, quando deveria encontrá-los pessoalmente. “Apesar das redes sociais poderem ajudar a enfrentar a solidão, elas não devem substituir as relações pessoais. A tecnologia não proporciona o contato humano, que realmente beneficia nosso bem-estar emocional”, afirma Smith.
Mas não é só o emocional que sente os prejuízos se estar só. “A solidão persistente está ligada ao estresse, assim como à piora no funcionamento do sistema imunológico e cardiovascular. A solidão modifica nosso comportamento e aumenta as chances de adotarmos hábitos de risco. Adultos de meia-idade solitários bebem mais álcool, têm dietas menos saudáveis e fazem menos exercícios do que as pessoas que permanecem socialmente conectadas”, diz Smith.
Admitir a solidão, no entanto, não é uma tarefa fácil. De acordo com a pesquisa, uma em cada três pessoas se sente constrangida em tornar público o que sente. “Talvez a sociedade veja a solidão como uma fraqueza ou como incapacidade de construir relacionamentos”,
explica Adriana.
Os especialistas garantem, contudo, que passar algum tempo sozinho pode ser positivo. “De fato, é um contrapeso necessário para a agitação da vida moderna”, afirma Smith. Permitir-se ficar sozinho, para pensar e refletir é, segundo Bez, o que chamamos de solitude, algo bem diferente de solidão. “Solidão é algo mais. É um estado emocional negativo da mente, que pode levar à ansiedade e a transtornos depressivos, que podem precisar de ajuda profissional”, completa Smith.
Leia mais: Cada vez mais brasileiros moram sozinhos
Nenhum comentário:
Postar um comentário