domingo, 23 de agosto de 2009

NA PRESENÇA DO MEDO



Na prensença do medo
Por Guilherme Bryan e Juliana Vilas redacao@folhauniversal.com.br Quem nunca teve medo de perder o que tem? Em tempos de crise econômica e de altos índices de violência, o temor de ficar sem pessoas queridas e o que se conquistou ao longo da vida se intensifica. A Ipsos, empresa francesa de pesquisas de opinião e mercado, ouviu 22 mil pessoas em 22 países no começo do ano e constatou: a perda do emprego é o principal temor mundial de 41% dos entrevistados – vem antes do medo da pobreza, da desigualdade social e até da violência, escolhida como o risco mais pavoroso por 31% das pessoas. Nos Estados Unidos, o pavor do desemprego levou 35% dos trabalhadores, segundo pesquisa do site CareerBuilder.com, a abrirem mão das férias. Esse temor, no entanto, sempre existiu. Em 2003, no Brasil, era a segunda maior causa de estresse, perdendo apenas para a violência, conforme levantamento da associação norte-americana International Stress Management Association. “Uma crise com as dimensões da que vivenciamos no fim do ano passado cria um clima de medo e incerteza em relação ao futuro e existem dados econômicos de que o mercado de trabalho foi o que mais sentiu os efeitos disso. Na bolsa de valores, onde o medo e os riscos fazem parte do processo de decisões, esses momentos fazem as pessoas ficarem inseguras”, explica Rossano Oltramari, analista de ações e sócio-diretor da empresa XP Investimentos. O mercado de ações onde Oltramari atua é um dos que mais envolve riscos e, consequentemente, medos. “Existem dois sentimentos presentes no dia a dia do investidor: a esperança e o medo. Ambos influenciam, de maneira muito ativa, a tomada de decisões. Quando o medo é maior, há mais pessoas vendendo ações e os valores caem. Quando a esperança é maior, ocorre, então, uma tendência de alta no mercado. Portanto, é preciso haver um ponto de equilíbrio entre os dois”, acrescenta. O medo é um dos sentimentos mais naturais e instintivos do ser humano. No passado, as espécies que temiam mais – e por isso evitaram certos riscos – tiveram mais chances de sobreviver. O ser humano, no entanto, tem a habilidade da antecipação, o que nos faz imaginar coisas terríveis que poderiam acontecer, mesmo antes que aconteçam. O medo natural, que nos protege de riscos desnecessários, é saudável e importante. A partir de certo ponto, porém, vira pavor e pode se transformar até em doença. E o medo de perder algo tem a ver ainda com o sentimento de posse, que nem sempre é bem-vindo. O psiquiatra e terapeuta Eduardo Ferreira Santos, autor do livro “Ciúme – o medo da perda” e doutor em Medicina pela Universidade de São Paulo (USP), explica que o temor de perder parceiro, namorada, esposa ou marido, envolve a dificuldade em lidar com as incertezas naturais da vida. “Muita gente acha que é dona do outro. Por trás disso, está uma brutal insegurança. A pessoa que tem ciúme pensa todo dia que será traída e que o outro pode trocá-la por alguém melhor.Com isso, transforma a vida de todos num caos, uma vez que usa armas para que o parceiro não fuja do controle”, explica Ferreira Santos. Outro temor que quase todo mundo tem é o de perder o que já conquistou na vida. Ferreira Santos admite que experimentou o medo de perder o prestígio na carreira. A sensação de ter atingido o objetivo mais sonhado da vida pode causar esse sentimento, mistura de depressão e pavor. Ele explica a saída escolhida: “A vida é dinâmica e exige um constante movimento. Quem atingiu o ápice precisa manter o que conquistou. Tudo que sonhei deu certo, mas, quando cheguei lá e peguei o diploma de doutorado, algo inimaginável para um garoto pobre da periferia, senti certa depressão, mas depois notei que deveria continuar dando aulas e aprendendo”, diz. A luta constante e diária para superar a depressão foi também o caminho escolhido pela carioca Daniela Duque, mãe de Daniel, que foi assassinado, aos 18 anos, em junho do ano passado, em frente a uma boate na zona sul do Rio de Janeiro. Perder um filho, um dos dramas mais dolorosos que alguém pode sentir, deixou Daniela revoltada e com muito medo do imprevisível. Em setembro, cerca de 4 meses depois da morte de Daniel, o pai de Daniela também faleceu. O primeiro sentimento dela foi um medo paralisante, de ficar longe das pessoas amadas, mas lutou para superar os temores. “Passei a ter mais fé. Comecei a valorizar o que realmente importa e fortaleci laços de amizade e amor. Já que não podemos evitar que as pessoas queridas nos deixem, é melhor aproveitar bem os instantes em que estão conosco”, avalia. Mãe de uma menina de 3 anos e de outro rapaz de 20, que mora nos Estados Unidos, Daniela percebeu que seria egoísta e possessiva ao tentar protegê-los de qualquer risco ou ficar achando que eles também poderiam morrer. Fez muita terapia para superar a perda de Daniel e transformou o medo numa nova – e melhor, segundo ela – forma de encarar a vida. O medo exagerado de perder algo ou alguém pode gerar tragédias irreversíveis. No começo deste ano, dois empresários bem-sucedidos se mataram porque perderam dinheiro com a crise econômica mundial. Thierry de la Villehuchet, de 65 anos, era dono do fundo Access International e se suicidou depois de levar um golpe de mais de US$ 1,4 bilhão (R$ 3,2 bilhões). Já o empresário Adolf Merckle, um dos 100 homens mais ricos do mundo, acordou, foi até uma estação de trem e deitou sobre os trilhos. As empresas dele perderam US$ 1,5 bilhão (R$ 3,5 bilhões), mas, mesmo assim, ele tinha um império avaliado em mais de US$ 9,2 bilhões (R$ 21,5 bilhões). Mais do que o medo de ficar pobre, o que pode motivar uma atitude desesperada de milionários e profissionais de sucesso é a sensação de fracasso, sinal de que, muitas vezes, dinheiro de sobra não é suficiente para preencher certos vazios e dar a segurança emocional necessária para ser feliz e viver plenamente, sem tantos medos.

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