quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Ah, se eu tivesse falado com minha mãe... Se não tivesse experimentado o álcool, se não tivesse entrado na prostituição, se não tivesse conhecido o crack...


“Quero ir embora agora!”


Chegou a noite, e a enfermeira que veio me medicar disse que eu estava indo bem e em poucas semanas sairia do hospital. "Semanas? Como assim? Quero ir embora agora! Eu mando na minha vida!" Um coração duro, difícil de penetrar sabe que estão pedindo a sua alma, mas não dá uma chance para ser feliz e muito menos para se salvar.

A "coisa" ficava lá, o tempo todo junto comigo. Será que ela não tem casa para ir, não?

Amanheceu e eu despertei, ainda muito fraca. Queria o crack, estava irritada, dependia de todos pra tudo.

Senti alguém mexendo nos meus cabelos, ou no que sobrara deles. Era a "coisa" que estava me penteando. Eu queria que ela saísse dali, mas não conseguia falar nem me mexer.

"A senhora é tão linda, e eu sinto tanto a sua falta... Nesta noite pedi a Deus para tirar você daqui com saúde. Naquele dia do tiroteio pedi para Ele cuidar de você, e Ele cuidou. Muitos morreram, mas não a minha mãe. Minha professora Clara disse que tudo o que pedir a Deus e crer Ele fará."

Será isso verdade mesmo? Será que posso mudar de vida? É muito bom para ser verdade! Ah, se eu tivesse falado com minha mãe... Se não tivesse experimentado o álcool, se não tivesse entrado na prostituição, se não tivesse conhecido o crack...

São tantos "se não tivesse"... Eu acreditava que era forte, que tinha controle sobre minha vida... Que nada! É só olhar para mim agora e ver meu estado, numa cama de hospital, sem forças, sendo cuidada por alguém que nem tem tamanho.

Ela é tão pequena e sabe tanto... Até consigo olhar para o seu rosto sem ter vontade de matá-
la ou de desprezá-la. Deve ser porque é a única que está comigo neste momento.

Minha tia ia me visitar e levava frutas, mas eu não me lembro, pois sempre estava sob efeito de calmantes.

Os dias foram passando e fui me recuperando, dia após dia, um atrás do outro, com remédios e uma luta constante por abstinência à droga.

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