Em Camarões, 25% das adolescentes têm o peito queimado pelas próprias mães, que veem o hábito como o melhor jeito de tentar atrasar o início da vida sexual das filhas
Engomar os seios das meninas com objetos extremamente quentes assim que aparecem os primeiros sinais do desenvolvimento sexual é uma tradição mantida às escondidas no oeste da África, especialmente em Camarões, onde um quarto das adolescentes sofre para disfarçar a puberdade. A prática, comum também em Guiné-Bissau, África Central e Ocidental, é normalmente realizada pelas próprias mães.
Alegando preocupação com os olhares libidinosos dos homens, encontros sexuais prematuros, estupros, abortos inseguros, gravidez indesejada e até o medo de que elas abandonem a escola, as mães passam diariamente nos seios das filhas pedras, paus ou martelos aquecidos em carvão incandescente. Outro motivo: em Camarões, muitos homens acham que as meninas estão prontas para o sexo quando começam a ganhar formas femininas. Muitas famílias acreditam que devem deixar as filhas “menos atrativas”, tentando, no mínimo, adiar o desenvolvimento do corpo das filhas.
No ritual propriamente dito, muitas vezes as mães usam um pano para proteger as suas mãos do calor, enquanto o peito da jovem é pressionado com força. Existem relatos de que, em razão das altas temperaturas, as meninas ficam com os seios deformados e com
tamanhos diferentes.
“Engomar os seios sempre existiu”, diz a ginecologista Sinou Tchana, vice-presidente da Associação de Médicas de Camarões, em entrevista ao site do “Diário de Moçambique”. Tchana trabalha há mais de 20 anos para conscientizar a população sobre os riscos da prática, que além de prejudicar o desenvolvimento do seio danifica o tecido, causa feridas, abscesso e infecção, deixando as meninas predispostas a contrair câncer, sem contar os danos psicológicos.
Em seu trabalho, a ginecologista encontrou mães desesperadas depois de terem queimado a mão e percebido o quanto machucavam as filhas. “Perdoa-me, doutora, eu não tinha noção da medida da dor, mas quando me queimei percebi o tipo de sofrimento que a minha filhinha passava”, disse uma mãe a Tchana que, por outro lado, já ouviu depoimentos de meninas em pânico, que torciam até para nem ter seios e de outras que decidiram fugir de casa para não passar pelo ritual.
Uma associação de mulheres chamada Renata, apoiada pela agência alemã GTZ, orienta 15 mil jovens camaronesas a evitar essa prática dolorosa, chamada de “passar a ferro”. Mas como o sigilo prevalece em relação ao tema e até mesmo homens camaroneses desconhecem o procedimento, porque falar sobre sexo é um tabu no país, a tradição é mantida há gerações pelas mulheres. Às vezes os homens só ficam sabendo da prática após se casar: são surpreendidos ao ver o estado do corpo da própria mulher.
Na internet, circula um documentário em vídeo que mostra uma professora explicando sobre os perigos do ritual. Diante de crianças incrédulas, um garoto confirma que sua irmã sofre com a situação e chora quando a mãe “passa o ferro” em seus seios.
O mesmo vídeo ainda apresenta imagens chocantes de como é o ritual e como ficam deformados os seios de mulheres já adultas. A professora admite que não é o modo mais adequado para se orientar as crianças, mas confessa o desejo de que elas não passem pelo mesmo sofrimento a que ela foi submetida.
No entanto, por outro lado, o mesmo documentário mostra que muitas mães, mesmo tendo vivido tal situação na juventude, ainda acreditam que “passar os seios” é a melhor maneira de evitar a atenção dos homens, por medo especialmente da gravidez precoce.
Ou seja, diante desse cenário, o segredo ainda prevalece na maioria das famílias, e uma em cada quatro meninas segue sendo alvo do ferro quente diariamente em Camarões, um país de 19,5 milhões de habitantes, dos quais cerca de 8 milhões têm menos de 14 anos. Assim, a partir dos 9 anos de idade, muitas meninas ainda devem ter os seios engomados.
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