terça-feira, 1 de março de 2011

Tensão


Por Kátia Mello katia.mello@folhauniversal.com.br
As cobranças vêm de todos os lados: família, trabalho, amigos, contas, prazos e metas a serem cumpridos. Na direção contrária, a falta de tempo, o trânsito, a noite de sono mal dormida, o nervosismo gerado pela insegurança. O estado ansioso acaba aparecendo mais cedo ou mais tarde, de maneira mais leve ou acentuada, dependendo de como cada pessoa lida com seus problemas. Mas uma pesquisa divulgada recentemente mostra que muita gente tem preferido recorrer a calmantes, mesmo que seu quadro clínico não exija este tipo de tratamento. Feito pela IMS Health, companhia que faz estudos ligados à indústria farmacêutica, o levantamento indicou que a venda do ansiolítico (remédio contra ansiedade) clonazepam cresceu 36% no Brasil entre 2006 e o ano passado, quando foram comercializadas 18,45 milhões de caixinhas, contra 13,57 milhões em 2006. “Os tranquilizantes de alta potência são os mais prescritos no Brasil atualmente. Entre eles estão o clonazepam e o diazepam. O aumento do uso ou da prescrição dos benzodiazepínicos no País se deve à baixa qualidade dos serviços médicos, à propaganda dos laboratórios e à condição de vida atual, que cobra soluções imediatistas e superficiais e leva ao aumento do estresse”, defende Luiz Figueira de Mello, médico do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo. “Os ansiolíticos são indicados para reduzir a ansiedade e a agressividade, para sedar e induzir o sono e também para reduzir o tônus muscular e a coordenação motora, além de ter efeito anticonvulsivante”, esclarece o psiquiatra Marco Antonio Alves, filiado à Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP). “Os efeitos dos tranquilizantes, quando bem prescritos, são, na maioria das vezes, benéficos. Podem até salvar vidas, evitando derrames, enfartes e comportamentos inadequados. Quando usados sem critério podem levar a acidentes, dependências ou sofrimento psíquico”, descreve Mello. Um dos principais perigos dos ansiolíticos é o risco de vício. Além de o uso contínuo fazer com que seja necessário aumentar a dose, há quem tenha crises de abstinência ao interromper o tratamento. Segundo o Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas (Cebrid), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), os sintomas vão desde insônia severa, irritação, agressividade, delírios, ansiedade, angústia, sudorese excessiva até convulsões. “Devemos levar em conta dois fatores de risco de dependência: a predisposição genética (tendência à drogadição) e o uso contínuo por mais que 12 semanas. O tempo para viciar é variável devido às condições biológicas ou metabólicas individuais. A interrupção do uso deve ser sempre gradual e com orientação médica”, explica Mello. A ansiedade, o estresse e a depressão acompanham o homem desde os tempos remotos, uma vez que são distúrbios que combinam problemas de ordem psicológica e fisiológica. “A ansiedade faz parte da vida das pessoas e é saudável tê-la em nível controlado. Ela nos torna mais focados. Perder o controle sobre ela é que atrapalha”, defende Marco Antonio Alves.
“Eu tinha terminado a faculdade e estava desempregado, com contas acumulando, além de uma série de outros pequenos problemas. Por estar extremamente ansioso, comecei a entrar em depressão, tinha insônias terríveis, comia apenas por obrigação. Fui a um psiquiatra e ele me receitou, por 3 meses, o Rivotril (clonazepam) e um antidepressivo, além de sessões de análise. Findados os 3 meses, não precisei mais recorrer ao medicamento, mas continuei a terapia”, conta o empresário Silvano Pestana, de 36 anos. Segundo ele, foi a terapia – e não o remédio – que o ensinou a lidar com os problemas. “Às vezes damos muita importância para um problema menor ou para tantas coisas ao mesmo tempo que acabamos não resolvendo nada e a ansiedade só piora”, diz. A atriz Fernanda Torres também recorreu ao Rivotril, mas não gostou. Ela escreveu sobre o assunto em sua coluna no jornal “Folha de S, Paulo”. “Passei 3 dias sonolenta e algo abobalhada, evitei dirigir. No terceiro dia, desestimulada e apática, achei que estava pior que antes. Decidi não recorrer ao medicamento na quarta noite e tive dificuldade para dormir. Fritei no lençol até 5 da matina. Passei o dia seguinte imprestável e, no outro, depois de uma noite bem dormida e sem sedativos, acordei refeita”, disse a atriz, que procurou um psiquiatra depois de detectar sintomas de depressão.

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