terça-feira, 25 de maio de 2010

INVEJA


Sentimento que corrói
Cobiçar o que o outro possui, sejam bens ou felicidade, são marcas da inveja, um desejo negativo que só faz mal. Cientistas tentam decifrar no Japão a origem deste sentimento no cérebro A maioria das pessoas já sentiu inveja um dia: aquela sensação incômoda de que, por mais que cuidemos do nosso quintal, a grama do vizinho será sempre mais verde. Mas a passagem de uma ponta de desgosto pelo sucesso alheio para um sentimento destrutivo, capaz de prejudicar o alvo da cobiça, pode ocorrer em um piscar de olhos, caso a pessoa não tenha autoconfiança, ou seja, não se sinta segura o suficiente para bancar as próprias escolhas de vida. É o caso das personagens Verônica (vivida pela atriz Simone Spoladore) e Cíntia (Carla Regina), na novela “Bela, a Feia”, exibida pela “Rede Record”. As duas morrem de inveja de Valentina (Gisele Itié), a Bela, que voltou à trama transformada e que agora é a mais bonita e tem o melhor cargo da empresa em que elas trabalham. Sem suportar a ideia de ter por perto uma mulher mais bela e competente que elas, Verônica e Cíntia tentam a todo custo derrubar a mocinha da novela. “Esse é o tipo de inveja mais destrutivo, mas o que as pessoas não sabem é que isso leva a própria pessoa invejosa a um sofrimento muito grande. Por outro lado, há uma forma de inveja construtiva, em que a pessoa gosta daquilo que o outro tem e se mobiliza para melhorar e alcançar o desejado. E não podemos esquecer daquela inveja que acaba virando um lamento, em que o sujeito se faz de vítima. Essa pessoa acaba fazendo com que o motivo da cobiça vire seu algoz”, avalia a psicóloga Rachel Zausner Skarbnik, da Faculdade Federal da Bahia (veja no quadro ao lado mais detalhes sobre os diferentes tipos de inveja). Muitas vezes esse sentimento negativo pode interferir na situação emocional de quem é vítima da inveja alheia. Bonita e competente na empresa de investimentos imobiliários em que trabalha, a executiva Q. S., de 32 anos, afirma que desperta a inveja de muitas pessoas no ambiente de trabalho, principalmente pelo alto cargo de vice-diretora que ocupa. “Já vi colegas cortando o cabelo igual ao meu ou com a mesma roupa que comprei. Quando contei que ia me casar, foi uma enxurrada de perguntas. Todo mundo queria saber detalhes, ouvia comentários de todo tipo e, nos dias seguintes, tive dores de cabeça fortíssimas. Fiz um monte de exames e nada identificava o motivo das dores. Mas comecei a não falar mais sobre o casamento, os comentários pararam e as dores passaram”, descreve a executiva, que prefere não se identificar justamente com receio de ser alvo de mais inveja.A psicóloga Rachel lembra ainda que o invejoso pode não ter um perfil definido e nem sempre é aquele totalmente desprovido de bens. Ela conta um caso que chegou ao seu consultório de duas mulheres que eram cunhadas entre si, sendo que uma delas tinha muito dinheiro e um marido bastante popular e querido por todos. A irmã dele não tinha marido nem uma vida financeira estável, mas era uma pessoa muito amada pelos amigos e pela família, inclusive pelo irmão. Mesmo não tendo bens ou um relacionamento bem-sucedido, ela era invejada pela outra, que estava casada e era rica. “Apesar de tudo o que tinha, ela chegou a tentar destruir os relacionamentos da cunhada jogando os amigos contra ela, porque pensava que não poderia ser tão amada na família quanto a outra. Então, ela passou por um tratamento psicológico para se fortalecer. Faltava a ela uma autoafirmação, de saber que também podia ser querida e que para isso não era preciso destruir a vida da cunhada”, afirma a especialista. Ainda não se sabe ao certo o mecanismo psicológico que causa a inveja. Uma das hipóteses é de que exista uma região no cérebro que controla esse sentimento. Essa foi a descoberta de um grupo de cientistas japoneses que espera poder tratar do mal que prejudica não só o alvo da maldade como também a própria pessoa invejosa. “Ao entendermos como funciona esse fator neurocognitivo poderemos prevenir e tratar esse tipo de conduta. A inveja pode levar uma pessoa a praticar um ato destrutivo e até criminoso para conseguir o que deseja”, disse Hidehiko Takahashi, pesquisador- chefe do departamento de Neuroimagem Molecular do Instituto Nacional de Ciência Radiológica do Japão à rede de notícias “BBC” na época do lançamento do estudo, em março do ano passado. Durante os trabalhos, 19 pessoas tiveram os cérebros monitorados por ressonância magnética. Os voluntários tinham que se imaginar em situações que envolviam outras três personagens. Nos testes, duas delas se mostrariam mais capazes e inteligentes do que os entrevistados. Quando sentiam inveja, a parte do cérebro chamada de córtex dorsal anterior era ativada. “Pessoas muito invejosas tendem a ter uma grande atividade nessa região do cérebro, que é responsável pela dor física e também é associada à dor mental”, contou o pesquisador. Outra parte cerebral relacionada ao sentimento de alegria acabava estimulada quando os voluntários liam sobre problemas com as personagens rivais. Isso explicaria como funciona o cérebro dos invejosos, que sentem prazer com a desgraça alheia. “Inveja não é necessariamente só querer ter o que o outro tem. É também não querer que o outro tenha algo e ainda ficar feliz porque o outro não tem ou não conseguiu ter. Muita gente se sente culpada por querer aquilo que julga bonito em outra pessoa. Mas isso é natural do ser humano e também pode levar a buscar formas de melhorar ou conseguir as coisas sem precisar derrubar outras pessoas”, avalia a psicóloga Sâmia Simurro, professora do MBA e especialização em Gestão de Programas de Qualidade de Vida da Pontifícia Universidade Católica (PUC) e da Universidade São Camilo, as duas em São Paulo.Sâmia ilustra a teoria com o caso de uma paciente que chegou a seu consultório sentindo uma culpa imensa porque uma colega de trabalho recebeu uma promoção que ela julgava ser dela (leia mais sobre o problema da inveja no ambiente de trabalho no quadro da página 10). “Com o tempo, ela entendeu que aquele sentimento era normal, e que ele poderia levá-la ao crescimento. E acabou se dedicando mais no trabalho e conseguindo uma promoção também”, lembra. Nem mesmo os familiares escapam desse sentimento negativo. Há relatos de famílias em que os pais tratam de forma diferente os filhos e, com isso, os irmãos crescem com inveja um do outro. Pior ainda é quando são os pais que invejam os próprios filhos. “Há pais com dificuldades para lidar com o sucesso dos filhos. Conheço casos de pessoas separadas cujos filhos são criados por um dos lados, só o pai ou só a mãe, e se tornam adultos bem-sucedidos. A parte que não esteve tão presente no dia a dia do filho acaba incomodada e até com inveja tanto do ex-parceiro, que criou bem o filho, como dos próprios filhos”, conta a terapeuta familiar Ângela Martins.

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